quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

MORTE

A morte
mora comigo
como um rio
de água gelada

A morte
conduz minha mão
e a caneta congela

A morte
ronda a rima
e lhe dá calafrios

Aceitar a morte
é um aprendizado
de pensar palavras
aquecidas a sete palmos

A morte
entendo: rimas
versos em poemas
que se transformam

Poemas que permanecem
como um corpo cinza
ou putrefato

Onde germes festejam
a vida.

NOVO VELHO TEMPO

Goles de tequila
estasy de alegria.

A era da imagem
ficctícias são,
viagens

Os e-mails nos prendem
com meias palavras
comidas

E no movimento repetitivo
o tempo se diverte
com a nova gente envelhecida.

BALADA

Som forte eletrônico
cabeças e azaração

início da repetição histórica,
roçar,
pênis com bunda,

Sempre tão geração.

PESO DA VIDA

Nos lençóis do tempo
suo meus desejos

Hoje, durmo com o mundo

E todas as noites
- mais do que meu gozo -
pesa-me o corpo do outro.

INSETOS

As cigarras entoam suas canções
não escutam ninguém
As formigas enchem suas despensas,
as baratas fazem a ceia no natal,
gente morre todo dia
eterno movimento da vida.
Morte, onde está tua vitória?

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

REVIVENDO

O sol
dá luz
Alua
nasce
de noite
amanhecerei
de novo?
só se o sol
sobreviver
quase...quase...
então
reviverei.

SOU FRUTA

Uma jabuticaba, menina,
atrevida, aventureira,
meu delírio.

Talvez madura...
ou tenra,
eu suponho,
na cama de solteiro.

Acontece...todas as noites

Ela vai - porque amanhece
será que lembrará
que sou fruta também?

AFOGADO

Finda a tarde
na horizontal.
O sol tomba suado,
mais um dia
de mercadoria

Lixo nas calçadas,
homens náufragos,
castelos de aguardente,
acordados,

afogados

No canavial
eu de passagem
navego

Ah! Ondas bravias
a envolver o mundo!
sonhos idealistas
montados

Marinheiro, só,
quase noite,vou,
remando num mundo míope,
eu, indignado.
Nenhum tsunami
aponta

só inércia, sem fim,

sigo só, contraditório.

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

VÍCIO

Ama negro
mucama
bate o tambor
abre a janela
se coça
se estira
roça
bamba
tinhosa
suada
sonha com branco
te comendo
 de aipim, que,
suja de vícios
não sabe o que é!

AMOR LOUCO

Não pensei
que viveria
esse sufoco
amor
coisa de louco
muito e pouco
entre tapas
beijos e socos.

FOTO

No facebook
alguém comentou
uma foto

A foto
nem ligou
pro comentário

Foi a foto
que te imaginou ao lado

envelhecendo...envelhecendo
a foto.

TRAIÇÕES

Traições
não me incomodam mais
nada de novo
nas costas

Fico atento
como sempre
olhando as costas
esperando a nova facada.

FRAGMENTOS DE UM TEMPO

Tempo
que é tempo
passa

Fragmento
fragmento
fica

Eu e o fragmento
fazemos a vida
que o tempo
constrói

IMAGEM

A imagem
passa a ser aquilo
que voce quer

Voce desconhece
que faz aquilo
que a imagem quer.

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

BOMBA

Sinto-me uma bomba
pronto pra explodir
de raiva, de ódio, de vergonha,
por viver num mundo de explorados
poetizando gente, rimando coisas.

RUÍDOS

Sou feliz preferindo-me morto
corpo mudo, surdo em paz
mudo como minhas pernas
procurando um caminho
surdo como uma ostra
que só ouve as ondas
em paz como as cigarras
que gritam nas árvores
rememorando tudo, sobretudo,
o som que vem do mundo
que cai levanta.

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

VOU PRA BALADA

A noite vou pra balada
meter com algum folgado
depois de duas doses
com quem em mim encosta
em algum motel
fudendo-me pelas costas
fode, lambe e dorme
na boca afoga o pau
sou submissa, contente
meu homem com fome
não sei quem é nem a cor
nem sei seu nome.

SEM VERGONHA

Adolescente
se afirmava
sem vergonha
dos caras
dava...dava...dava...
toda festa
chupava
tomava
vara.

Lá no Rio de Janeiro
mora um punheteiro
cassete grande, liso
como ela gosta - fica
põe na garganta o narciso.

ESPERMA E RIMA

Um desejo sem gemido
num lençol
nem grosso nem fino
sol colostro

Tudo é cama
livre libido
esperma e rima

O verso é bom
quando combina
com gozo e vômito

No que dá
um frenético suor
nesse desejo sem lugar?

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

ANDARILHOS

Os Kms percorridos por um andarilho não o fazem um herói.
Os gritos anônimos nos interiores das casas de crianças,
não silenciam os mares ainda.
Continuamos revirando as latas de lixo à sinfonia da barriga.
Os soldados continuarão marchando comemorando
suas vitórias, ao som dos coturnos, agitando bandeiras.
Andarilhos não podem andar só, não podem andar só,
As armas e os tanques não trazem alimentos,
a farinha da pólvora não tem um bom cheiro.
A côr do sangue do andarilho também é vermelho
Como poderemos viver vivos, fingindo não enxergar?
Andarilhos não podem andar só, não podem andar só.

domingo, 7 de novembro de 2010

MORTE

De amor foi semente
crescida
ira e ódio - a vida
escolheu não morrer
de morte matada
morreu morrida.

NOITE

A noite
um óvulo passeia por mim
de manhâ se vai
vai e volta
a galope
pra lutar minhas lutas.

FILME

Jabuticaba foi ao cinema
ver um filme de ficção
estória de um alazão negro
que namorava um poema

namorava porque era poeta
residia na parte esquerda da lua
poema, desses que lutam lutas pequenas

Jabuticaba ficou triste
com aquela estória de amor
Insiste sempre com a lua:
- Amanheça por favor!

BARBIE

Voce me barbie
eu todo me barbeasse
a pé
todas as barberagens
sobre os lençóis cor de morangos,
onde
sim - sorrindo
eu bobeasse.

NÃO ENTENDO GAROTAS

Não entendo
mesmo
garotas jovens.
Nós as amamos
idosamente
e elas se vão
sem mais nem menos
como se entre nós
nunca tivessem
existido baladas.

REFLEXÃO

Tudo que faço
altera os fatos
um caroço de azeitona
não me basta no prato.

IDÉIAS

Uma lâmpada
na cabeça.
O cérebro
também quer pensar.

AFRONTA

Dia
sem por de sol
desanoitece
no escuro
na noite, quase

Dia em si
na linha reta do horizonte
transborda de indignação
fuzis ou lua
que, enfim te afronte.

SUICÍDIO

Muitos rios afogados
embebedam meus caminhos,
hei de morar noutro lugar.
Brinco de amarrar o lençol no pescoço
pra ir me estrangulando aos poucos.

PERGUNTAS

Vivo pra perguntar
Há algo além do que foi, do que é, do que sempre será?
Soube que sim, que tudo muda a todo momento, cada segundo,
momento e maçã.
Não é demasiadamente pesado o fardo do conhecimento
de que tudo é definitivo?
Soube que de tanto, ver, viver, conhecer, há muito caminho
a percorrer e muito a saber.
Devo crer nos dedos que me apontam a vida?

ADOLESCENCIA

Daqui a pouco
deixo a adolescência, ainda,
não cheguei aos oitenta.
Não beberei como hoje
tentarei ser como papai,
farei direito
darei o diploma
para os sonhos de mamãe
casarei com uma mulher virtuosa
não farei filhos nela
Ela? Não sei...criarei.

SEGUNDA

Segunda
uma borboleta
voava
tão colorida
que dava
pra por
na salada.

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

SER

Ser mais infectado que a selva
esterco que cobre o chão,
o jumento confuso
esbraveja, não agrega,
não comunica ninguém.

JARDIM

Sampa travestida de Ipês
torres decadentes impiedosas,
vanguardas angustiadas de lírios
passeiam em seus jardins,
enquanto em Brasília,
as espadas de São Jorge e bromélias,
sufocam as flores do campo.
As rosas sâo uma ilusão,
mas precisamos dessa primavera,
depois de outonos tão tristes?

ESPELHO

Tudo tão cotidiano
que inclui também
eu.

Tudo tão eu
que inclui também
nós.

Tudo tão frágil
que não possa quebrar
vidro.

Tudo tão reflexivo
quanto eu, nós, vidros,
no espelho.

ME ACABO

Um pênis erecto
imagina
que uma vagina
sovina
só se preenche
não sente

Com meu dedo eu afirmo
a lingua fala sempre
diante do gozo
eu babo
nesse poema
que acabo.

EU

Me transformo
em mim mesmo
depois dos 40.
Ainda confundo
harmonia
com este incômodo
que vivo.

SONHOBOBO

Quero acordar revolucionário,
um guerrilheiro bastardo,
Como um Chê cubano - charuto
gritando:
Viva a revolução! Depois,
morrer de dengue
na Amazônia.

NEO GERA-AÇÃO

Meu coquetel Molotov
fiz numa garrafa
De Moet Chandon,
sou um revolucionário Chic
que lançara chamas
nos olhos azuis da terra.

MORADIA

Eu faço minha moradia

Comecei com o desejo,
depois dei nome pra rua
com placa dependurada
na ponta do meu fuzil,
no choro, na morte na escuridão

Grupo, massa, luta,
eram uma fábula,
valiam-se mais do discurso,
e como as marés,
se moviam pra morrer se preciso.

E assim o dia chegou
juntaram-se muitos e muitos.
Na rua fincara-se em mutirão,
nessa noite chorei.

Janelas surgiram pra apreciar
o amanhã
Todos fazendo o dia juntos,
as mãos calejadas, o choro torturado,

A construção subia,
eu podia agarrar meu desejo,
que sorria de contentamento.

Das sobras dos sarrafos,
fiz cruzes pra aqueles que morreram,
que não veriam suas moradias,
sem portas, paredes rachadas, sem memórias

Era por eles que o desejo persistia:
portas perdidas, abrigos sem fundação,
sem vida.

O desejo do alto das janelas
se edificava nos nos rostos da vizinhança.

terça-feira, 19 de outubro de 2010

TEMPO DE CÓLERA

Não respeitamos o tempo
o vento corta com sua última lufada,
apoiado pela multidão de sombras,
até quem confiamos se atrasa

sempre soubemos de onde viria
a faca da sombra que nos cortaria o norte
aceitamos paralisados, decepados,
ficou a lembrança, embora reprimida.

Não sei se haverá resgate,
ainda estamos vivos. Ventania
que como tufão nos carrega,
nunca entendemos, todavia, amamos.

sempre soubemos de onde viria
a faca da sombra que nos cortaria o norte
quase sucumbimos as facadas,
fica lembrança, de um tempo de cólera.

PERDA

Vejo em teus olhos inocentes, uma menina muda,
olhos de tartaruga, menina rara, de faz-de-conta,
faz-de-conta - a vida.

Guardo tua menina na memória
nas noites rebeldes em casernas,
gritando torturada seus delírios.

Olhando sua imagem refletida
através do vidro no chuveiro,
aprendo a dor da perda,
no momento que precede meu choro.

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

MUROS

Um muro que divide homens
tem os tijolos quebrados,
um muro em pedaços
na cidade viva, de homens
sujeitos divíduos estilhaços,
eu morrendo aos pouquinhos
partículas pulsantes, voando,
como gás carbonico na noite.
Um muro levantado dorme,
de manhã derrubado.

ESTRELA

Nunca aprendeu nos livros,

o ronco da barriga,
que comia vento,
por Deus.

Caído na masmorra,
Nú, espantalho,
beijando cuturnos
na bacia do banheiro.

Um pássaro com mêdo,
amarelo, boca costurada,
de pupilas brancas
como a lua cheia.

Todos o olhavam de luneta,
tentando enxergá-lo,
numa constelação.

ETIÓPIA

A tristeza fala comigo
como uma criança etíope,
após aparecer na tv.(...)

Se a poesia não falar,
os pitbuls morderão

Escrevo as palavras
nos jornais que te cobrirão.
Palavras frescas,
que não falam.

Quando a elas recorro,
poemas que ouvem
seus corpos magérimos,
a fome grita.
É o que posso fazer só.

CONFISSÃO

Quero lhe confessar, mulher meu delírio,
meu ombro dói pelo peso da cruz
da madeira das camas numeradas de gozos,
carência associada a vida material que cavalgo,
polvos amigos, polvos familiares, que me apertam
com seus tentáculos que me cercam,
cercas de gente que me aprisionam.
Viajo a hipocondria, sem dinheiro, sem baladas.

Afirmo, mulher meu delírio,
que minha hipocondria,
é fruto ficcional que comi na infância,
gulosamente adocicado pela história,
os polvos não estarão acima de mim
na cadeia alimentar, não mais.
(rrsrsrsrsrsrsrsr...)

Lavei-me em banho frio,
me machuquei demais,
vou pichar polvos pelas noites.
O tempo todo, mulher meu delírio,
pensarei no mar com amargura.
O arquipélago dos predadores
não receberá mais minhas visitas!

Bastará, querida mulher,
uma barraca de praia, um saco de dormir,
um samba de roda na esquina,
quem for amigo virá comigo sem reembolso
e me dirá: Prazer estar contigo!
Sem rugas, sem juízos, sem remédios,
Os polvos não me abraçarão mais... por ora.

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

ITANHAÉM

Afogado pelo mar
pelas marés que passeam como cobras
passeios que buscam lágrimas
deixarei meus castelos d´areia

Com as algas que não fazem graça
e minha companheira com o rosto de jabuticaba

Com os vagalumes de sorriso frouxo
e o céu assassinando o tempo, com sua raiva cinza

Com o stress deixado na cama
e um pernilongo cantando aos ouvidos

Passeamos diferentes a cada dia pelas ruas de Itanhaém
deixando nossos castelos d’ areia

PERTURBAÇÃO

Um grilo
pertuba os sonos
os sonhos fragmentados
passam
fogem pelas pupilas
chorosas.
É, assim como a lagarta
pulsa suas asas para o voô
para pescar flôres,
a ficção boia
numa negra realidade.

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

COBIÇA

Meu olho sempre cobiça o que vê,
mais o ouvido sobre o que ouvê.
Palavras feministas - numa boca de menina
que quase nunca entendi, afirmações poéticas,
dúvidas, nas poucas mulheres que escutam
com a identidade há muito perdida.

Não vi Rosa Luxemburgo, nem Cora Coralina,
com todas suas contradições, naquele dia.
As mãos suavam, o corpo desequilibrado.
Meu olho continuava cobiçando o que via,
mais o ouvido sobre o que ouvia.

Minha cobiça, meu começo, difícil,
deixei o juízo sobre, fui ao avesso,
hegemonicamente feliz,
outros sonhos, outras teorias prenhas,
me levaram a afirmar a mesma realidade

Um início, reinício, início,
reinício, início, um vício.
Cultuado como amor

Um mundo falso, imagético, fictício,
Em todos os becos, em janelas anônimas, barracos.
tua voz sempre presente - idealista,
pensando um trabalho que realizasse os sonhos,
grana, carros, gente bonita, gente bela.

Fast foods a quem não me curvo
o mesmo corcunda, de ti eu vivo
dialeticamente uma vida.
Como pensar materialmente o sentimento?
Fala-me Marx, Hengel, Trotsky, Mayakovsky!

Alguém me diga!

Vivo o medo do espelho se quebrar,
de ser diferente aos seus pais, aos meus.
A mim , me amendontra, ser igual,
tão igual aos meus pares, me aventuro
a um novo começo ao avesso.

Vendo o cinza nos olhos do outro, vejo um muro,
me aventuro a pular - nessa, menina mulher,
minha cúmplice - nós gazelas saltitantes.
São elas, as meninas mulheres que sabem,
viver deuses de chocolates e bolinhos de chuva.

Jamais serei o homem que inventaram,
capaz de suprir o desejo dessa nova Amélia,
que é contra a harmonia, que não é monogâmica,
feminista que não sei se entendo,
sem rima, sem Rosa, sem Coralina.

Meu olho sempre cobiçou o que via
Mais o ouvido sobre o que ouvia
O sabor é mais interessante, experimento.
Porque adoro jabuticaba...de noite...de dia

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

EU PEIXE

Estou me transformando em um Marlin azul
Tendo sido barco agitado na vida com velas ao mar
não sou mais timoneiro, continuo lobo
com todos os anos vividos
Mas deixo perdidos meus portos pra trás
Quero viver diferente, pois a sorte da gente
É a gente que faz

A vida navega, me vou a deriva
procurar outros mares,para aportar
prefiro um mar grande, que eu siga como peixe,
Se eu sou um bicho marinho
O mar é meu ninho, minha cama, minha casa .

SOLIDÃO

Solidão é como areia
grudada pelo corpo
Mordendo com seus dentes de vidro
incrustrada no vácuo peito
arfando mudo, sem perpectivas de amanhã

Catarina chora, Cris ama agora ,
Marias reviram na cama, a espera
Fui ensinado a lembrar meu passado
para construir novos dias

Sonhos surgem nas noites vazias,
viajando atracando noutros portos,
rolo na areia, contemplando a lua
Sei que existe nessa imensidão de mar
cura para essa amargura

OLHAR 9MM

Ao ser trocado por um filme
Não me levei tão a sério
Como ser fictício
Que sou.

As coisas não são o que penso
E nunca serão
Visto em 9mm
Preto e branco


Eu pensando no filme
Fictício, sério, eu vou
numa viagem
Que não é mais a mesma,
.

Ao ser ser trocado por um filme
Preto e branco sueco
Não me levei tão a sério
Como ser fictício
Que sou.

ENTREGA

Movida pela sensibilidade
Sua entrega é profunda
Profunda sensibilidade
Numa lógica infunda
Lógica corcunda
Infinda curva
Profunda e insensível
lógica entrega.

terça-feira, 24 de agosto de 2010

O CORPO

Viajo por um corpo que não me comporta
carrego cacos e cacos na memória.
D'um vaso de sêmem incontinenti de agora
Não há como fugir desse corpo,
não se refaz, não se comporta,
sempre acorda, com o ar da manhã
sorridente, novamente mentiroso.

A CARNE

A vagina agridoce semiraspada
um caminho sempre pronto,
e prestes a ser seguido.
Nas margens umedecidas,
um cheiro de borracha e bromélias.
As cochas grossas arrepiadas
se espreguiçam - prontas
é o chamado do sexo.

As caras de nós amarrotadas,
de manhã o ânus, grosso de cólera,
um menino-homem triste - chora
a mão da mulher lhe afaga, a falha,
descuidada morde, além da cueca,
a carne.

FALSO

Como seu corpo, em segredo,
como seu resto. Imagino
que sinto na boca,
saliva, brilho, suspiro, troça,
amor, sempre além
entre algo, sempre,
uma calça, um vestido,
um compromisso inadiável,
uma camiseta largada,
no quarto 407 na Lapa,
a língua atraś, na frente ,
jaz na cama seu cheiro,
eu esboço um sorriso suado,
um promissor jorro de esperma - em falso.

AINDA TEM JEITO

Minhas pernas, meu mal
mal amanhece me faz caminhar,
meu pênis, mal me suporta,
malmequer, me amaldiçoa,
não se apaixona como eu,
Do meu corpo preciso cuidar,
corpo suspeito que acabará,
sem escapatória, se não lhe der cuidados,
se não lhe der respeito,
tem jeito...ainda tem jeito.

É PRECISO MUDAR

Vivo o homem de ontem
rimado em algum livro
personagem belo e feio
completamente mortal
Ao meu desejo de entrega
covardemente prisioneiro
de mim mesmo.
Se algo não mudar
em poesia vou me transformar.

É COMIGO?

- Do que você está falando?

Do gozo.
Quando será que ele vem?

Corpo Letal
Maré incansável.

Virá do Norte ou do Sul?
Qual deles será o começo ou o fim.

- De quem você está falando?
De geografia ou de mim?

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

DIVAGANDO

Encorajado entro na prisão dos teus dias
que gritam por eu não ser o que prometi.

Os gritos não ouço, estou surdo de ti.

Para escapar de uma igreja barroca
onde gritam meus dias pelo mesmo motivo.

*Direitos Reservados*

SOBRE AMOR

Sem saber onde o amor vai dar
cegos, inventamos de novo
navegando a deriva.

Aprisionamos a noite. Acordamos o dia.
Numa praça em Paris a cheirar flores.

Sujeitos a infartos num plantio de lírios.
Infartados descobrimos estar doentes.

*Direitos Reservados*

sexta-feira, 13 de agosto de 2010

NUNCA FUI DE ALGUÉM

Gostei muito de alguém, de quem nunca fui, nem de mim mesmo
Gostei sobretudo da vulva que dava jabuticabas
E de todas as outras coisas que pareciam mentiras.

Nunca soube no que daria
Mesmo por mares revoltos, preciso
No além horizonte impreciso

Ouvidos a toda hora, a mesma boca, abraços frouchos,
o mesmo nada alguma coisa
Como é o calor que é calor ou a libido que também o é.

Eu desejei isso, melhor que não ser,
Não havia outra maneira de querer a não ser querer tambem
Uma borboleta que fosse pra lua, lugar onde não fui
Desisto!

Acabou!
Gostei muito de alguém, de quem nunca fui, nem de mim mesmo,
nem teu, nem nosso, nada o tempo todo, em tempo nenhum
Gostei sobretudo da vulva que dava jabuticabas
E de todas as outras coisas que pareciam mentiras.

A UMA MULHER JOVEM

Jovem, aonde?
Claro, não é mulher, mas a idosa
que a gravidade fez o corpo despencar,
não é mulher também.
Não há firmeza no que você diz.
Mas o que diz?
Decorou nos livros suas afirmações.
Que afirmações?
Seja firme.
Com quem?
Tem muito carinho.
Pra quem?
Ama alguém hoje.
Tem o amor de alguém?
É uma jovem interessante.
Será para todos?

Presta atenção: sabemos que viver de ilusão pode ser bom, mas que a verdade atrapalha.
Por isso vamos deitar na nossa cama. E pensar que pelo fato de seu corpo ser jovem o amor
será eterno. Deitamos em um bom colchão e gozamos a noite inteira. Espermas lambuzarão
suas pernas enquanto o corpo for jovem, depois você encostará a barriga no fogão que aquecerá teu ventre, que gestará gente jovem novamente.

ENTRE O VELHO E O NOVO

Na relação entre geração envelhecida
com outra que gera-ação, que constrói novos dias,
nasce um sol lutando contra uma noite que persiste,
observo entre a luz e a escuridão, o rosto
de uma aventura, que o velho já não permite,
uma se exige limites, a outra limites
que inexistem, amor é possível?
Serenamente ambas ingerem emoção,
Bêbadas, automatamente, tentam encontrar
aquilo que não se guardou e que ao achar nunca saberão o que é.

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

COMPROMISSO

Num dia desses uma mulher
me acariciava os cabelos
pronta pra me despir
com os olhos

A respiração ofegava,
no pescoço balançava a imagem de Nossa Senhora,

Ficou claro pra mim,
como um simples carinho,
pode significar desejos
tão comuns a outras mulheres.

RECORDAÇÖES

Abri as cartas de amor
que ainda continuavam jovens,
a cada folha lida
subiam cheiros de naftalina
infestando minha sala,
as ondas da vida estão agitadas,
minhas cartas mudaram de nome
são e-mails que abro,
que num circulo vicioso,
me diz que o amor ainda é o mesmo
o amor que o corpo murcha,
o amor aduba,
aduba... o corpo,
e depois desfolha.

VELHOS SONHOS

Levantarei meu teto
com o martelo dos meus braços
e uma varanda de frente para o poente
como um apaixonado, como engenheiro do meu destino,
como um Apollo, com um coração de Ghandi.

Atrasarei o relógio para não bater meia-noite,
Nunca!
Pisem no meu jardim pra roubar meus lírios,
na areia escreverei meus versos, sem rimas,
vivendo poeticamente o adverso.

Não sei porque desacordo o homem
vezes por vezes e me torno um trágico poeta,
versado por cordas que me movimentam,
marionete de domingo em final de campeonato
dando ossos de frango aos cachorros.

Menina, mulher em minha carne, é ela
Feminina cúmplice desse tempo,
cobre-me de abraços, que o homem,
também lhe fará versos.

PEDAÇOS DE NOITE

Já é duas da manhã,
Sim ou Não? Sobre nossas vidas.
Minhas mãos apertam sua blusa de frio,
enquanto você tira a sorte
no mês de agosto,
o frio me corta o rosto e o dorso.
Descendo a Brigadeiro a navalha
do tempo corta o que penso,
imprudente, busco abrigo
sem nenhum bom senso.

Já é duas da manhã,
você deve estar na cama
você provavelmente entre 4 paredes
deve sonhar o mesmo,
falo com você amanhã
não há pressa
pra que lhe tirar o sono
com o impessoal toque
de um celular.

Rolam as lágrimas
chora o sono, o sonho se vai,
acorda! Amanhã chegou antes,
companhia, companheira de danos.

Já é duas da manhã,
você deve estar na cama
provavelmente entre 4 paredes
tira a sorte no mês de agosto,
nessas horas converso com estrelas
sonhando o mesmo na cama
Amanhã chegou antes,
companhia, companheira de danos.
Vê como me calarei.

Palavras que brincam, palavras de Sapucaí
não aquelas ao som da bateria no recuo
mas as que ferem profundo, que expõe
o símio em cada sujeito bípede
as vezes são esquecidas, nem ouvidas,
ecoam somente em bueiros, buracos de tatus
que alimentam-se de poetas mortos,
palavras somente palavras não ditas
escritas, pelo homem que teme a si próprio.

A MILITANTE

Conheci uma mulher, lutadora,
carinhosa mais firme.
Firme na batalha, carinhosa na cama,
Seu trabalho aparentemente pequeno,
é sem medida, insubstituível.
Onde quer que esteja não a deixarei só.
Com ela lutarão, amazonas, mulheres de Atenas, firmes e astutas
em cada canto do mundo,
todas serenas, pequenas, boas formigas,
contra a opressão do pensamento masculino.

sexta-feira, 23 de julho de 2010

SENTIMENTO

Gosto tanto
que é fácil confundir-me
sobre o que sinto,
reconheço que ao gostar de mim
tudo não passa de egoismo
que não gosto de ninguém afinal.
Há um momento em que o outro
de fato é considerado
noutro momento negado,
um dia que existe
outro dia pensado,
vamos existindo pequenamente,
gostar de alguém que a gente
acha que tem, é ter alguém
em quem tem se que pensar
Alguém que não é de ninguém.

(Para a amiga Cristina Fernandes)

terça-feira, 20 de julho de 2010

DIA A DIA

Levanto o jornal que noticia o dia,
meu filho, ainda sonolento,
boceja a pinga de ontem.

Levanto o lençol rosa, e minha filha
numa bermuda rasgada
sorri, parada. acordada.

Levanto o cobertor azul, e minha mulher
me olha; o cheiro do café quente,
eu entrego e sorrio.

Só o dia negro ainda dorme e ronca
O Estado há muito não sabe o que é gente.

AO AMOR

Não se deitará em meu peito
vermelho, coração violento,
você é um predador - não sou caça
você é um laçador - eu sou fuga
não me fará sofrer o sentimento
deprimido, em correria
enfia a cabeça na terra,
chora com o estômago - avestruz.

COMO JABUTICABA

Como jabuticaba do céu,
na terra, na vida,
um poema sem métrica caiu,
sem poeta, sem lugar,
maluca é - a poesia.

TOMARA UMA VEZ

Tomara uma vez
eu ser pra voce
uma pérola
Ai de outra mulher usar
num pescoço de futilidades
eu pérola
Ela se enrugará de desgosto
diante dos espelhos dos banheiros
Tomara uma vez eu ser pra você
uma pérola
os espelhos rirão de nós dois
como você ri de mim agora.

GAROA

A garoa com a cumplicidade do frio
Ah, frio calafrio
Eu não a vejo, ela não me vê
gente de frente

Garoa fina que molha
frio, navalha que corta

Lá vou eu sem crença, sem fé
Pronto a tudo
Preso a nada...

domingo, 30 de maio de 2010

OLHAR POR OLHAR

Pelo seu olhar tem meu corpo,
tem meus sonhos,
minha pele parda,
meu olhar de namorado,
meu amor lento.

Pelo meu olhar tem outra vida
com pensamentos sérios,
sobre teatro, me esperando
na sala de trabalho,
tem minha paixão de homem,
tem minha inspiração de poeta.

Do outro lado pessoas vivas,
atarefadas me esperando,
sem flores nas mãos,
mas com seios decotados
que me pensam em pecado.

Se continuarmos olhando
pro fim do mar
sem ver os peixes, sem ver vida
ficamos e vamos,
como as ondas sem amor,
que morrem todo o tempo
na praia.

(Para minha amiga Cris)

*Direitos Reservados*

QUEIMANDO

O frio me corta
cortado por carros
gente sem gente
de idéias elétricas
confortáveis, condicionadas,
rodando com o pensamento
caminhando apoiadas em rodas.
Atravessado pelos faróis
eu vou, trêmulo no tempo,
sem trono do rei,
doente burguês hostil.
Ao meu redor bailam cinzas,
respiro judeus, revolucionários,
outros tantos, com mêdo,
o mundo que suspeito padece
nos porões que não conheço,
incandeço como brasa,
pra ser em breve cinza
para pulmões efizêmicos.

sábado, 20 de fevereiro de 2010

SOBREASSALTOS

Caminhar pelas ruas
escuras ou iluminadas,
é somente.

A aventura está,
no assalto a cada parada.

*Direitos Reservados*

GORDURAS

Um sol gordo
se escode atrás
de um horizonte magro,
pra olhar a noite se despir.

SEGREDOS

Meu barco a vela
não ilumina o mar
Mar que não conheço a fundo

Onde o vento quer morar de vez.

teatro que encena mundos.

Lá em terra estão abatendo pêssegos!
Assim como fazem aqui com as baleias.

*Direitos Reservados*

VERDADES

Priscila mentiu
que não gostava de mim

Existem olhares
feromônios
cheiros de mar

O amarrotado pedido dos lençóis
dos gemidos

Priscila -
Sinceramente, o poeta
deitou.

*Direitos Reservados*

ARRASTÃO

Eram muitos
tinha surf, tinha sol

Eram muitos
e nos atravessaram

Eram muitos
gafanhotos na praia

Eram muitos
lavaram tudo

Eram muitos
nenhum tinha nome

Nossos braços de rios
desaguando no mar

*Direitos reservados*

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

MOVIMENTO

Pensa-se na vida
como um eterno movimento.
Pensa-se no movimento,
como um círculo que se repete
negando a negação.
A vida é movimento, é certo,
mas não algo redondo,
talvez sinoidal, não...não...
certeza ser espiral.

SOLITÁRIO

Teu corpo é um deserto
disfarçado de areia.

Em cada grão, encontro
estrelas
poesias

Vale a pena camelar

Pensar e observar,
imaginar sua companhia.

NECESSÁRIO

É necessário
que as marcas no meu lençol,
sejam para sempre?
E teu perfume seja parceiro,
no meu deserto?

É necessário
pentear os cabelos,
grisalhos
com nossa experiência,
sem a preocupação
que os adolescentes
nos reproduzam.

CÃES A SOLTA

Há um cheiro de tensão no ar
o sol revoltado, não deita no mar,
quem pensa com versos, cuidado!
As botas resolveram marchar, juntas.
As ruas estremecem. Porque?
Os cães se livraram das coleiras.

MENINO?

Sob o embalo materno
com talco em meu cheiro,
lembro-me do orgulho nos olhos
daqueles que me diziam menino,
mas na minha memória,
não lembro de saber
o que era isso.

MORTO VIVO

O que sou
me fizeram
Oque penso
pensamos
O que faço
já foi feito
Quero sair
me trazem de volta
Tento morrer
me ressuscitam
Sempre morto vivo.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

ENCHENTES

Enchente nas bocas
molham o meio das pernas

Estraga o samba. estraga a festa,

As borboletas se divertem
entre pássaros performáticos

Suores íntimos
arranham a pele

Estamos vivos! Estamos vivos!

Gritam os espermas.

INFORMAÇÃO

Meu jornal meu cobertor

Não vou me cobrir nesses dias de ignorância
depois de uma vida inteira de palavras escravisadas

meu jornal meu cobertor

Não vou me cobrir, no entanto
no meu canto, municio minha arma
e me atiro aos versos.

CORPO

O corpo é um porto
O porto é um morto,
no horizonte deitado
Um corpo vivendo ao lado,
um lado desorientado
com um pôr do sol no fundo,
Lá até onde o olho alcança,
começa e termina,
corpo e porto.

terça-feira, 19 de janeiro de 2010

ALIENAÇÃO

Alienei-me.

sem perceber, nos rostos anônimos das ruas do centro, as vidas eificadas, meu espelho, mais que isso, é como se não houvesse gente, dentro de mim, a dizer-me: acorda!
volta-se as ações.
abre-se ao desconforto.
deixa-se levar pelo movimento da vida.

deixo que as contradições me atravessem, que o mundo me possua, me possua, me leve a reflexão, continue, pra que eu possa fazer e refazer, sem ter certeza, certo de estar certo.

o fazer é meu foco, como um pragmático intelectual, para sentir mudanças que não havia sentido.
deixo a apatia da alienação, a morte em vida, com ternura e faço meus dias.

volto-me as ações.
Abro-me ao desconforto.
Deixo-me levar pelo movimento da vida.

quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

FAZENDO AS HORAS

Como um guerreiro indígena
pinto-me para a guerra.
Levanto minha lança e lanço
gritos de indignação
sem medo do que venha a acontecer,
por andar de ombro a ombro
com aquilo em que acredito.
A fome e a opressão me fazem
ter essa coragem.

Para os sonhadores
sou mais um idealista
sob o pressuposto do idealismo.
Meus pais me ensinaram
os primeiros passos: como pensar,
a forma certa e errada de me portar,
encheram-me de juízos de valor;
aprenderam com quem?
Pergunto-me.

Fora do casulo
confronto as contradições,
daquilo que acho que sei,
com o que acham que sabem
os outros.
Alço vôo pelos jardins
e observo o roubo das flores;
permaneço calado.
Me deparo com o pisoteio
dos jardins e a caça as borboletas;
permaneço calado.
Quando por fim resolvo gritar
para o mundo, arrancam-me a voz
e cortam-me asas;
já não posso voar ou falar.

Fica claro que o movimento
na terra se acelera e não nos é possível
perceber ou descansar, sob a égide da barbárie.
Os cachorros continuam a obedecer às ordens
de comando, e nós que não somos domesticados,
ficamos calados de terror.
Afundado no travesseiro fantasio um levante;
ao acordar suado, sinto o gosto do mar na boca.
Um vírus me corrói corpo, está preste a me destruir.


Dormindo e acordando diante
das mudanças lentas, fica claro
que minto a mim mesmo, só repetindo
a história de outros heróis que não mais precisamos.
A televisão me mostra quem é Duro de matar,
Matando minha consciência.
Livros de apóstolos são lidos para embalar
meus dias e me alimentar de esperanças
enquanto o estômago ronca, com a promessa
de que todos os homens serão julgados um dia.
Não estamos atrás de vingança,
queremos igualdade em vida.
Nenhum monarca divino ou terreno deve traçar
nossos destinos: basta de sermos súditos!
Nem justiça ou Salvador aparecerão
nas prateleiras de algum supermercado.

Plantamos flores e colhemos;
na hora da paga pelo esforço,
lá estão eles como aves de rapina
a espreita para nos roubar, em nome
da nossa segurança; mas se nos defendermos.
é sobre nós que eles marcham e nos pisoteiam
com os coturnos que lhes demos; e
temerosos vivemos sob o slogan liberdade.
È chegada a hora de não ter mais medo,
afinal a vida é efêmera, acaba-se, sem aviso,
precisamos fazer valer a existência:
fazendo nossas horas segundo a segundo...


*Direitos Reservados*

sexta-feira, 1 de janeiro de 2010

CABERNET

O que eu menos esperava
nesse fim de ano turbulento
era encontrar uma sereia
me seduzindo com seu canto,
sentada em um cogumelo
no meu prato de sopa,
como numa dessas cenas de teatro,
enquanto o vinho aquece, o canto,
foi massageando as flores da sala
leve e carinhosamente como um origami
como faria Ana se aqui estivesse,
bebendo comigo essa taça de cabernet.

(Para a amiga Ana Catarina Romitelli)

MUDANÇAS

Os meus sonhos sobem
por uma escada rolante,
quem sou balança
em meio a um jardim
de cimento armado
repleto de flores hipócritas,
só nos jazigos observo
os corpos na posição exata
em silêncio, esperando
para se transformar em
outra coisa.

Se mesmo inerte pressupõe–se
em movimento, meu corpo,
como entender um movimento
inerte em vida?
Vasos de hipócritas
em silêncio e jazigos,
pedras no caminho,
uma coisa é outra coisa,
nada se aposenta nada é definitivo,
tudo é vida pra quem olha
além do mundinho inventado,
das teorias interiorizadas,
existe vida pra aquém de nós mesmos.

MARGEM

Quando digo que a chuva
chora,
que o rio gargalha
não é porque a chuva verte em lágrimas,
nem que o rio realmente se diverte,
é para alertar todos, a olhar pra margem,
pois unidos chuva e rio
transbordam por cima dela,
e ela, a margem ,continua
lutando pra não se afogar.

QUALIDADE

A maçã verde tem um cheiro ácido
verde que se quer verde,
não se envergonha e se avermelha,
vermelha viva e suculenta,
sem ser devorada entristece,
marron apodrece experiente
aguardando o fim do começo
do próximo movimento da vida.

PRA SEMPRE

Estou a surfar nas cristas de uma onda de mar,
misturando-me ao verde azul imenso,
a onda me arrasta apagando o caminho as minhas costas,
a brisa sopra me acariciando o rosto,
espumas sorriem as bordas da prancha,
vou sendo levado achando que comando meu trajeto,
eu vou, mas o mar, as ondas e a areia
ficam, permanecem pra sempre.

CINZAS

O céu chora uma chuva fina que cai
o vento se lamenta vez em quando,
lavando o tapete de flores de ipês
sob os resmungos do ranzinza trovão.
Uma lagarta na varanda faz buraco num casulo.
Abre-o, acende uma vela.
O pássaro da pintura na parede lambe os beiços.
Escapa da cela escura, pra liberdade.
A mulher do meu desejo foi pra longe espreitar outras possibilidades.
Outros homens, outros olhos, serão vistos e verão
que não se pode deixar o coração aberto com as flores da primavera:
Um pensamento de amor é uma lembrança de cinzas.

DÉJÀ VU

Ontem passou não é como hoje;
o que fiz já não faço da mesma forma
o conteúdo não é o mesmo.
O mundo, hoje, continua em movimento.
O Sol, a lua, nascem separados,
essa lembrança de que nada é para sempre
me incomoda, me faz refletir, dói muito.

Novamente recebo a paga do meu trabalho,
paguei todas as contas, pra minha existência,
até o prazer me custa, vago pelo escuro
do quarto, olhando as ruas iluminadas.

Da janela olho pra fora
E vejo você nas nuvens de cabelos negros,
voando pra longe em férias,
movimento de amor, sem happy end.

Tudo sempre diferente
tudo claro como o céu cinza
nesses meus devaneios num eterno déjà vu.